quarta-feira, 28 de abril de 2010

O Espiritismo

Geralmente fazemos dos Espíritos uma ideia completamente falsa; eles não são, como muitos imaginam, seres abstractos, vagos e indefinidos, nem algo como um clarão ou uma centelha; são, ao contrário, seres muito reais, com sua individualidade e uma forma determinada. Acreditamos ainda que os Espíritos, só pelo facto de serem Espíritos, devem ser donos da soberana ciência e da soberana sabedoria: é um erro que a experiência não tardou a demonstrar. Entre as comunicações feitas pelos Espíritos, algumas são sublimes de profundidade, eloquência, sabedoria, moral, e só respiram bondade e benevolência; mas, ao lado dessas, há aquelas muito vulgares, fúteis, triviais, grosseiras até, pelas quais o Espírito revela os mais perversos instintos.
As instruções dadas pelos Espíritos de categoria elevada sobre todos os assuntos que interessam à humanidade, as respostas que eles deram às questões que lhes foram propostas, foram recolhidas e coordenadas com cuidado, constituindo toda uma ciência, toda uma doutrina moral e filosófica, sob o nome de Espiritismo.
Os factos e princípios sobre os quais ele repousa perdem-se na noite dos tempos, pois encontramos seus vestígios nas crenças de todos os povos, em todas as religiões, na maior parte dos escritores sagrados e profanos.
Se as almas ou Espíritos podem manifestar-se aos vivos, é que isso é natural e, portanto, eles devem tê-lo feito todo o tempo; assim, em qualquer época e lugar encontramos a prova dessas manifestações abundantes, sobretudo nos relatos bíblicos.
Na Antiguidade, o estudo desses fenómenos constituía o privilégio de certas castas que só os revelavam aos iniciados; na Idade Média, os que se ocupavam ostensivamente com isso eram tidos como feiticeiros e, por isso, queimados; mas hoje não há mistérios para ninguém; tudo se passa claramente e todo o mundo pode esclarecer-se.
A própria doutrina que os espíritos ensinam hoje não tem nada de novo; é encontrada em fragmentos na maior parte dos filósofos da Índia, do Egipto e da Grécia, e inteira no ensinamento de Cristo. Em resumo, o Espiritismo suaviza a amargura das tristezas da vida; acalma os desesperos e as agitações da alma, dissipa as incertezas ou os terrores do futuro, elimina o pensamento de abreviar a vida pelo suicídio; da mesma forma torna felizes os que a ele aderem.
Do ponto de vista religioso, o Espiritismo tem por base as verdades fundamentais de todas as religiões: Deus, a alma, a imortalidade, as penas e as recompensas futuras; mas é independente de qualquer culto particular. O seu propósito é provar que a alma existe, que ela sobrevive ao corpo, que ela sofre depois da morte as consequências do bem e do mal que fez durante a vida corpórea; ora, isto é de todas as religiões.
Como crença nos espíritos, também não se afasta de qualquer religião, ou de qualquer povo, porque em todo o lugar onde há homens, há almas ou espíritos; que as manifestações são de todos os tempos, e o relato delas acha-se em todas as religiões, sem excepção. Pode-se, portanto, ser católico, grego ou romano, protestante, judeu ou muçulmano, e acreditar nas manifestações dos espíritos.
Como moral, ele é essencialmente cristão, porque a doutrina que ensina é tão-somente o desenvolvimento e a aplicação da do Cristo; e a moral está ao serviço de todo o mundo.
O Espiritismo, sendo independente de qualquer forma de culto, não prescrevendo nenhum deles, não se ocupando de dogmas particulares, não é uma religião, pois não tem nem padres nem templos. Aos que indagam se fazem bem em seguir esta ou aquela prática, ele responde: Se a sua consciência pede para fazê-lo, faça-o; Deus sempre leva em conta a intenção.
Então, o que vem fazer o Espiritismo?

Texto retirado de “O Espiritismo na Sua Expressão Mais Simples” de Allan Kardec e debatido na reunião da AELA, na 3ª feira, dia 13 de Abril de 2010

NOTA:
Em Janeiro de 1862, Allan Kardec publicou, na "Revista Espírita", o seguinte comentário sobre o opúsculo "O Espiritismo na Sua Expressão Mais Simples", que acabava de editar:
"O objectivo desta publicação é dar, num quadro muito sucinto, o histórico do Espiritismo e uma ideia suficiente da Doutrina dos Espíritos, para que se lhe possa compreender o objectivo moral e filosófico. Pela clareza e pela simplicidade do estilo, procuramos pô-lo ao alcance de todas as inteligências. Contamos com o zelo de todos os verdadeiros Espíritas para ajudar à sua propagação. - Allan Kardec"

domingo, 25 de abril de 2010

INTELIGÊNCIA ESPIRITUAL

No livro QS - Inteligência Espiritual, a fí­sica e filósofa americana Dana Zohar aborda um tema tão novo quanto polémico: a existência de um terceiro tipo de inteligência que aumenta os horizontes das pessoas, torna-as mais criativas e se manifesta em sua necessidade de encontrar um significado para a vida. Ela baseia seu trabalho sobre Quociente Espiritual (QS) em pesquisas só há pouco divulgadas de cientistas de várias partes do mundo que descobriram o que está sendo chamado "Ponto de Deus" no cérebro, uma área que seria responsável pelas experiências espirituais das pessoas. O assunto é tão atual que foi abordado em recentes reportagens de capa pelas revistas americanas Neewsweek e Fortune. Afirma Dana: "A inteligência espiritual coletiva é baixa na sociedade moderna. Vivemos numa cultura espiritualmente estúpida, mas podemos agir para elevar nosso quociente espiritual".

Aos 57 anos, Dana vive em Inglaterra com o marido, o psiquiatra Ian Marshall, co-autor do livro, e com dois filhos adolescentes. Formada em fí­sica pela Universidade de Harvard, com pós-graduação no Massachusetts Institute of Tecnology (MIT), ela atualmente leciona na universidade inglesa de Oxford. É autora de outros oito livros, entre eles, O Ser Quântico e A Sociedade Quântica, já traduzidos para português. QS - Inteligência Espiritual já foi editado em 27 idiomas, incluindo o português (no Brasil, pela Record). Dana tem sido procurada por grandes companhias interessadas em desenvolver o quociente espiritual de seus funcionários e dar mais sentido ao seu trabalho. Ela falou à EXAME em Porto Alegre durante o 300º Congresso Mundial de Treinamento e Desenvolvimento da International Federation of Training and Development Organization (IFTDO), organização fundada na Suécia, em 1971, que representa 1 milhão de especialistas em treinamento em todo o mundo. Eis os principais trechos da entrevista:

O que é inteligência espiritual?

É uma terceira inteligência, que coloca nossos atos e experiências num contexto mais amplo de sentido e valor, tornando-os mais efetivos. Ter alto quociente espiritual (QS) implica ser capaz de usar o espiritual para ter uma vida mais rica e mais cheia de sentido, adequado senso de finalidade e direcção pessoal. O QS aumenta nossos horizontes e nos torna mais criativos. É uma inteligência que nos impulsiona. É com ela que abordamos e solucionamos problemas de sentido e valor. O QS está ligado à necessidade humana de ter propósito na vida. É ele que usamos para desenvolver valores éticos e crenças que vão nortear nossas ações.

De que modo essas pesquisas confirmam suas ideias sobre a terceira inteligência?

Os cientistas descobriram que temos um "Ponto de Deus" no cérebro, uma área nos lobos temporais que nos faz buscar um significado e valores para nossas vidas. É uma área ligada à experência espiritual. Tudo que influência a inteligência passa pelo cérebro e seus prolongamentos neurais. Um tipo de organização neural permite ao homem realizar um pensamento racional, lógico. Dá a ele seu QI, ou inteligência intelectual. Outro tipo permite realizar o pensamento associativo, afectado por hábitos, reconhecedor de padrões, emotivo. É o
responsável pelo QE, ou inteligência emocional. Um terceiro tipo permite o pensamento criativo, capaz de insights, formulador e revogador de regras. É o pensamento com que se formulam e se transformam os tipos anteriores de pensamento. Esse tipo lhe dá o QS, ou inteligência espiritual.

Qual a diferença entre QE e QS?

É o poder transformador. A inteligência emocional me permite julgar em que situação eu me encontro e me comportar apropriadamente dentro dos limites da situação. A inteligência espiritual me permite perguntar se
quero estar nessa situação particular. Implica trabalhar com os limites da situação. Daniel Goleman, o teórico do Quociente Emocional, fala das emoções Inteligência espiritual fala da alma. O quociente espiritual tem a ver com o que algo significa para mim, e não apenas como as coisas afectam minha emoção e como eu reajo a isso. A espiritualidade sempre esteve presente na história da humanidade. No iní­cio do século 20, o QI era a medida definitiva da inteligência humana. Só em meados da década de 90, a descoberta da inteligência emocional mostrou que não bastava o sujeito ser um génio se não soubesse lidar com as emoções. A ciência começa o novo milénio com descobertas que apontam para um terceiro quociente, o da inteligência espiritual. Ela nos ajudaria a lidar com questões essenciais e pode ser a chave para uma nova era no mundo dos negócios.

Dana Zohar identificou dez qualidades comuns às pessoas espiritualmente inteligentes. Segundo ela, essas pessoas:

1. Praticam e estimulam o autoconhecimento profundo;
2. São levadas por valores. São idealistas;
3. Têm capacidade de encarar e utilizar a adversidade;
4. São holísticas;
5. Celebram a diversidade;
6. Têm independência;
7. Perguntam sempre "por quê?";
8. Têm capacidade de colocar as coisas num contexto mais amplo;
9. Têm espontaneidade;
10.Têm compaixão.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

O regresso dos choques eléctricos

Depois de décadas em que caiu em desuso, a electroconvulsivoterapia, mais conhecida por choques eléctricos, voltou a ser usada para tratar patologias mentais graves e resistentes à medicação. Em Portugal, já é aplicada em várias unidades com toda a segurança.
É difícil esquecer as violentas imagens, tantas vezes repetidas nos filmes americanos, de doentes psiquiátricos a quem eram infligidos electrochoques. O preconceito enraizou-se, até na classe médica, e só na última década é que esta terapêutica voltou a ser aplicada no nosso país.
"Actualmente, a técnica é usada com recurso a anestesia geral, relaxantes musculares, para evitar os espasmos, e com todos os meios de reanimação", explica António Gamito, director do Departamento de Psiquiatria do Centro Hospitalar de Setúbal e organizador do 2.º Encontro Nacional de Electroconvulsivoterapia, que hoje se realiza em Sesimbra.
As sessões decorrem em bloco operatório e são seguidas de um curto período de recobro, findo o qual uma pessoa jovem e sem complicações médicas pode voltar à sua rotina, de acordo com o especialista, que enfatiza as condições de segurança de todo o processo e a necessidade de consentimento, por escrito, do doente.
Mais eficaz do que fármacos
O que a electroconvulsivoterapia provoca é uma convulsão, através de meios eléctricos, que se traduz em algo semelhante a um ataque epiléptico. António Gamito explica que, embora se desconheçam ao certo os mecanismos, há vasta prova da sua eficácia no tratamento de depressões graves e perturbações bipolares que não respondem à medicação, bem como de surtos psicóticos transitórios, para mais rápido controlo de alucinações e delírios.
Trata-se, porém, de uma terapêutica de última linha para casos bem seleccionados, já que tem indicações muito precisas e exige meios dispendiosos. O director de Psiquiatria do Centro Hospitalar de Setúbal, que se interessa há dez anos por esta terapia, realça que há portadores de certas perturbações que são altamente resistentes aos psicofármacos.
Nesta situação, encontram-se principalmente pessoas com perturbações do humor, ou seja, depressão ou doença bipolar. As depressões endógenas (com forte componente genética) tendem a ser crónicas e a não responder eficazmente à medicação. Com um tratamento de quatro a seis electrochoques, é possível remitir significativamente a sintomatologia, sublinha o psiquiatra, que adverte, porém, para a possibilidade de recaídas e da necessidade de sessões de manutenção.
Como qualquer tratamento, a electroconvulsivoterapia tem contra-indicações, como história de problemas cardíacos, por exemplo, e acarreta os riscos de uma anestesia geral. "As desvantagens são quase inexistentes, desde que aplicada a doentes bem estudados, em instalações adequadas e por técnicos experientes", garante António Gamito.

HELENA NORTE


Fonte: JN, de 16/4/2010

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Ciência discute intuição nas decisões - Simpósio reúne especialistas de renome em áreas de fronteira do conhecimento

A intuição na tomada de decisões é o tema central do simpósio "Aquém e além do cérebro", que decorre no Porto. Especialistas de renome internacional, incluindo a investigadora que inspirou Dan Brown, lançam dados para um debate que se adivinha polémico.

Cada um de nós já tomou decisões com base em critérios nada racionais. Não há quem controle racionalmente toda a sua acção. Todos já agimos sem pensar, confiando em primeiras impressões ou nesse processo de difícil definição que é a intuição. Na tradição de lançar ao escrutínio científico temas de fronteira, a Fundação Bial promove, nesta edição, um debate sobre a intuição na perspectiva das neurociências, da parapsicologia e do impacto na vida social, explicou ao JN Fernando Lopes da Silva, da comissão organizadora do evento.

"É um problema científico longe de reunir consensos, mas a intuição parece tratar-se de um processo automático e inconsciente de tomada de decisões", explicou o professor de Fisiologia da Universidade de Amesterdão (Holanda), acrescentando que o cérebro executa processos de preparação - detectáveis em exames de imagiologia - das acções que a consciência não capta.

Marilyn Schlitz, directora do Instituto de Noética da Califórnia (EUA), notabilizada por alegadamente ter inspirado o livro de Dan Brown "O Símbolo Perdido", vai apresentar os resultados de estudos que pretenderam avaliar o impacto da oração no estado de saúde de doentes. 

A este propósito, o neurologista Alexandre Castro Caldas, da comissão organizadora, garantiu que "estudos feitos com amostragens significativas, construídas com base em métodos aleatórios credíveis, demonstraram resultados [de cura] muito superiores ao normal nos indivíduos alvo de prece por parte de terceiros à distância"


Fonte: JN, de 8 de Abril de 2010

Primeiras impressões são fiáveis?


Devemos ou não confiar nas primeiras impressões? A questão foi lançada, ontem, quinta-feira, no simpósio "Aquém e além do cérebro" pelo neurocientista belga Axel Cleeremans. A resposta é que sim. Mas só em relação a matérias de que somos especialistas.

Este ano subordinado ao tema "Intuição e decisão", o simpósio dissecou, no primeiro dia, a questão do ponto de vista das neurociências. No âmbito do projecto europeu "Measuring consciousness - bridging the mind brain gap", Cleeremans, da Universidade Livre de Bruxelas avaliou a importância de processos inconscientes na tomada de resoluções.

Quando vemos algo ou alguém pela primeira vez, começamos logo a avaliar um conjunto de dimensões. As impressões que formamos sobre alguns aspectos - como a atracção, por exemplo - é imediata. Quando temos de tomar decisões, recorremos às primeiras impressões que decorrem da experiência acumulada.
Isso não significa que sejam obrigatoriamente correctas. Por vezes, baseamo-nos em estereótipos, preconceitos ou até em experiências prévias que foram arquivadas (memorizadas) de forma errada e decidimos da pior forma possível, sublinhou o especialista ao JN.

As experiências de Cleeremans concluíram que, quando estão alertadas para a necessidade de tomarem uma decisão, as pessoas fazem-no de forma mais correcta, porque prestam atenção a todos os detalhes, e que as primeiras impressões só são confiáveis quando se trata de assuntos de que se tem vasto conhecimento. Nesta perspectiva, a intuição não é mais do que a "aplicação do conhecimento", sem que seja necessário percorrer todos os passos do processo analítico para se chegar à melhor conclusão.

Entre os múltiplos factores que interferem numa deliberação conta-se também o stress. O trabalho de Nuno Sousa, investigador da Universidade do Minho, demonstrou que, quando sujeitos a stress crónico, as cobaias agem de acordo com o padrão mais habitual de comportamento e não segundo objectivos. Este estudo, agora em fase de testes humanos, demonstra que o stress pode ser predictor de más decisões.

Fonte: JN, de 9 de Abril de 2010

quarta-feira, 7 de abril de 2010

A IMPORTÂNCIA DO SORRISO NA CASA ESPÍRITA

Outro dia um amigo me confidenciou que estava muito preocupado com a ausência de sorrisos e calor humano no interior das Instituições Espíritas.
E que a nossa Doutrina é otimista, trazendo nova luz para a vida; por que é que há tanta gente carrancuda dentro das Instituições?
Não pude deixar de concordar com ele.
De fato, tenho percebido que muitas instituições, através de seus dirigentes e trabalhadores, a guisa de manter a seriedade doutrinária comprometem o seu humor, a simpatia, o calor humano, como se o mundo se resumisse às carrancas, ao sofrimento e ao pessimismo.
Não podemos esquecer que normalmente quem procura o Centro Espírita está com dificuldades, está desanimado, está sofrendo. Se mantemos uma postura sisuda, com humor fechado, e sem a luz de um sorriso, devemos saber que temos a chance de estarmos contribuindo para influenciar negativamente aqueles que nos procuram, piorando a situação.
Talvez por um atavismo judaico-cristão associado com a idéia equivocada de que o sofrimento é enobrecedor e é sinal de evolução (o que está errado, evidentemente) é que esses irmãos e irmãs que preferem a carranca ao sorriso estejam agindo assim.
Que jamais faltem sorrisos nos Centros Espíritas, pois, nada mais animador do que ser recebido com um Sorriso e Calor Humano. Pois nós não somos máquinas. Somos seres humanos, seres espirituais, tendo o compromisso de transformar o mundo para melhor. Para que sombras em nosso rosto?
Não podemos esquecer que o abismo atrai o abismo e que sorrir sempre é a garantia de espalhar a Paz e a Alegria a contagiar aqueles que estão ao nosso redor, onde quer que seja.
E a Casa Espírita detém um papel de fundamental importância como irradiadora da luz, sendo nossa postura a lâmpada a propagar essa boa energia. Se fecharmos o nosso rosto, estaremos impedindo o fluxo dessa luz. Pois, “cara” fechada não é sinal de evolução.
(vamos fazer uma campanha entre os voluntários: – VALORIZAR O SORRISO!

Joaquim Ladislau Pires Júnior.

Fonte: O Arauto - ÓRGÃO DE DIVULGAÇÃO DA UNIÃO DAS SOCIEDADES ESPÍRITAS INTERMUNICIPAL DE PIRACICABA (Brasil) - Ano VII – N° 64 – JANEIRO/FEVEREIRO – 2008

domingo, 4 de abril de 2010

Um quarto dos portugueses não crê na vida eterna

Entre eles estão 10% de  católicos que vão  à missa com regularidade.
Cerca de 25% dos portugueses não acreditam na vida para além da morte. E destes 10%, ou seja 250 mil, são católicos praticantes. Esta é a conclusão do inquérito de uma socióloga da Universidade do Porto que ajuda a explicar porque é que a principal festa cristã, a Ressurreição de Cristo, não tem hoje impacto social.
Quase 90% dos portugueses afirmaram-se católicos no censo de 2001. Mas nem todos acreditam nos pilares essenciais da fé cristã. Segundo o estudo, um quarto dos portugueses pensa que com a morte tudo acaba, recusando-se, assim, a admitir a existência da vida eterna, uma crença que os cristãos sustentam na Páscoa, que hoje se celebra.
Entre os descrentes estão mesmo 10% de católicos que vão regularmente à missa. E ainda 26 % dos que o fazem ocasionalmente. "Na perspectiva cristã isto não tem coerência mas do ponto de vista sociológico tem. Vivemos um tempo de religião autoconstruída, onde domina o sincretismo e há uma religiosidade difusa, muito centrada no indivíduo", disse Helena Vilaça ao DN.
A socióloga diz que há pessoas que praticam a religião por tradição, até se identificam com a moral e a ética, mas não têm a fé sustentada nas raízes cristãs. "É o preço que se paga nos países em que houve uma relação forte entre a identidade nacional e a religiosa", adianta. Mas o fenómeno não é português. Em França, a falta de fé na ressurreição afecta 40% dos fiéis. No futuro, perspectiva, os cristãos tenderão a ser cada vez menos, mas mais convictos na fé.
Joaquim Costa, sociólogo da Universidade do Minho, diz que neste contexto não é surpreendente que o tempo pascal passe despercebido. "Uma certa faceta da secularização torna estes factos quase inevitáveis", diz. "As pessoas mantêm-se crentes mas a sociedade é ateia nos seus princípios de funcionamento. Gera-se um caldo cultural que privatiza a crença e, por isso, ela parece desaparecer da vida pública, mesmo que persista fervorosa nos templos e casas."
Recuperação das tradições
O sociólogo das religiões fala, contudo, em "reacções recentes que procuram inverter este processo e dar testemunho público de fé". Como, por exemplo, a colocação de estandartes festivos nas janelas, uma iniciativa que começou no Natal, se repetiu agora, e teve milhares de aderentes (texto ao lado).
Hugo Santos, capelão da Universidade Católica de Lisboa, também reconhece que a importância da Páscoa já não se reflecte na vida prática de muitos cristãos. "Perdeu a expressão central que tinha na vida dos fiéis", afirma. Para o sacerdote, o recuo da influência da dimensão social e cultural tem um efeito: "As pessoas fazem desta caminhada uma expressão mais íntima e pessoal."
A prova disso, diz, está nas famílias católicas mais novas, que já não assistiram à dimensão cultural e social da Páscoa, mas estão a recuperar as tradições. "E, quando se recupera, recupera-se na verdade", acrescenta, dando o exemplo de novos tipos de penitências, renúncias e orações na Quaresma.
"Não beber café, abster-se da sobremesa ou fumar menos são opções que custam. Mas a ideia é que a pessoa se dê conta deste impulso e o ordene segundo a sua necessidade." Entre os exercícios de domínio da vontade estão ainda hábitos como ver televisão ou julgar o outro. Hugo Santos explica que, com isto, se pretende centrar o crente na relação com Deus e os irmãos, reforçando a oração, e partilhando com os que menos têm o resultado da sua renúncia.
As indicações de jejum, esmola e abstinência têm fundamento bíblico, explica o padre, e fazem parte da preparação para a Páscoa. Abdicar da carne à sexta-feira é ajudar a criar um espaço de reflexão interior, diz. "A carne é associada à energia, dispõe para o trabalho. Sem ela, o crente sente mais a fragilidade de Cristo".

 por RITA CARVALHO


Fonte: Diário de Notícias, de 4/4/2010

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