quinta-feira, 1 de julho de 2010

Lei do karma não é lei de causa e efeito

«A palavra karma utilizada na Índia e por muitas correntes filosóficas e religiosas, significa em primeira instância “acção”, “trabalho” ou “efeito”. No sentido secundário, o efeito de uma acção ou, se preferirmos, a soma dos efeitos de acções (vidas) passadas reflectindo-se no presente. Na concepção hindu, karma quer dizer “destino” determinado ou fixo.» in “O Verbo e a Carne” de José Herculano Pires
Ora o destino enquanto determinismo é precisamente um ponto em que a Doutrina Espírita diverge da lei do karma uma vez que esta pressupõe sempre uma dívida a ser resgatada enquanto a Doutrina Espírita se posiciona de modo diferente. A lei de causa e efeito apresenta-nos a ideia de que o futuro depende também das acções e decisões do presente. Uma causa positiva gera um efeito positivo e uma causa negativa gera um efeito igualmente negativo, ou seja, para o Espiritismo cada ser humano é um espírito imortal encarnado que herda as consequências boas ou más das suas encarnações anteriores. Em “O Livro dos Espíritos”, pergunta 1009, lê-se o seguinte: «Dizeis que, acima de tudo, Deus é justo e que o homem não lhe compreende a justiça. Mas a justiça não exclui a bondade e ele não seria bom, se condenasse a eternas e horríveis penas a maioria das suas criaturas. …no fazer que a duração das penas dependa dos esforços do culpado não está toda a sublimidade da justiça unida à bondade? Aí é que se encontra a verdade desta sentença: A cada um segundo as suas obras.»
Retendo apenas a frase “A cada um segundo as suas obras” e ignorando a parte onde se refere “que a duração das penas depende dos esforços do culpado” podemos deduzir que significa a aplicação da lei do karma mas vejamos outro trecho do mesmo livro, pergunta 178: «Podem os Espíritos encarnar num mundo relativamente inferior a outro onde já viveram? “Sim, se for para cumprir uma missão e ajudar ao progresso. Aceitam com alegria as dificuldades dessa existência, porque lhes oferecem um meio de avançar.”
Mas, não pode dar-se também por expiação? Não pode Deus degredar para mundos inferiores Espíritos rebeldes? “Os Espíritos podem conservar-se estacionários, mas não regridem. Em caso de estacionamento, a punição deles consiste em não avançarem, em recomeçarem, no meio conveniente à sua natureza, as existências mal-empregadas.”»
E em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, cap. V. § 9, escreveu Kardec: «No entanto, não se deve acreditar que todo o sofrimento suportado aqui na Terra seja, necessariamente, o indício duma determinada falta; muitas vezes, os sofrimentos são simples provas escolhidas pelo Espírito para concluir a sua depuração e acelerar o seu progresso. Assim sendo, a expiação serve sempre de prova, mas nem sempre a prova é uma expiação. Porém, provas ou expiações, na verdade são sinais duma inferioridade relativa, visto que o que é perfeito não precisa de ser provado. Um Espírito, portanto, pode ter chegado a certo grau de elevação mas querendo avançar mais ainda, solicitar uma missão, uma tarefa a cumprir e pela qual, se sair vitorioso, será tanto mais recompensado quanto mais penosa tenha sido a luta.
E, na mesma linha, escreve Léon Denis em “O Problema do Ser, do Destino e da Dor”, 2ª parte: «É necessário evitarmos ver, nas provações e dores da Humanidade, a consequência exclusiva de faltas passadas. Todos aqueles que sofrem não são forçosamente culpados em vida de expiação. Muitos são simplesmente Espíritos ávidos de progresso, que escolheram vidas penosas e de labor para colherem o benefício moral que anda ligado a toda a pena sofrida.»
E acabando novamente com Kardec e “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, cap. V, § 7: «Tanto os sofrimentos devidos a causas anteriores como os resultantes das faltas actuais são, muitas vezes, a consequência da falta cometida, ou seja, por uma rigorosa justiça distributiva, o homem sofre o que fez sofrer aos outros; se foi duro e desumano poderá, por sua vez, ser tratado duramente e com desumanidade; se foi orgulhoso, poderá nascer em condições humilhantes; se foi avaro, egoísta ou fez mau uso dos seus haveres, poderá ver-se privado do necessário; … etc.

Texto lido e discutido na AELA em 2 de Fevereiro de 2010

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