terça-feira, 18 de maio de 2010

Esquecimento do Passado e O Pensamento

Infelizmente objecta-se que o esquecimento constitui obstáculo a que se possa aproveitar da experiência de vidas anteriores.
Se Deus considerou conveniente lançar um véu sobre o passado, é que há nisso vantagem. Com efeito, a lembrança traria gravíssimos inconvenientes. Poderia, em certos casos, humilhar-nos singularmente, ou, então, exaltar-nos o orgulho e, assim, entravar o nosso livre-arbítrio. Em todas as circunstâncias, acarretaria inevitável perturbação nas relações sociais.
Frequentemente, o Espírito renasce no mesmo meio em que já viveu, estabelecendo, de novo, relações com as mesmas pessoas, a fim de reparar o mal que lhes fez. Se reconhecesse nelas as pessoas a quem odiara, talvez o ódio reaparecesse. De qualquer modo, sentir-se-ia humilhado em presença daquelas a quem tivesse ofendido.
Para nos melhorarmos, deu-nos Deus, precisamente, o que necessitamos e o que nos basta: a voz da consciência e as tendências instintivas, tirando-nos o que nos poderia prejudicar.
Ao nascer, o homem, em cada existência, tem um novo ponto de partida. Pouco lhe importa saber o que foi: se é punido, é porque praticou o mal. As suas más tendências actuais indicam o que lhe falta corrigir em si próprio e é nisso que deve concentrar toda a sua atenção, porquanto, do que foi completamente corrigido, não resta nenhum vestígio. As boas resoluções que tomou são a voz da consciência, advertindo-o do que é bem e do que é mal e dando-lhe forças para resistir às tentações. Aliás, o esquecimento ocorre apenas durante a vida corporal. Voltando à vida espiritual, readquire o Espírito a lembrança do passado; trata-se, portanto, duma interrupção temporária, semelhante à que se dá na vida terrestre durante o sono, a qual não nos impede de lembrar, ao acordarmos no dia seguinte, o que se fez na véspera e nos dias anteriores.
E não é somente após a morte que o Espírito readquire a lembrança do passado. Pode dizer-se que jamais a perde, pois que, como a experiência o demonstra, mesmo encarnado, adormecido o corpo, ocasião em que goza de certa liberdade, o Espírito tem consciência dos seus actos anteriores; sabe por que sofre e que sofre com justiça. A lembrança unicamente se apaga no curso da vida exterior, da vida de relação. Mas, na falta de uma recordação exacta, que lhe poderia ser penosa e prejudicá-lo nas suas relações sociais, ele adquire forças novas nesses instantes de emancipação da alma, se souber aproveitá-los.
À medida que a alma avança na vida espiritual, esclarece-se e liberta-se pouco a pouco das suas imperfeições, conforme o grau de boa vontade que empregue, em virtude do seu livre-arbítrio. Todo o mau pensamento resulta, pois, da imperfeição da alma; mas, de acordo com o desejo que possui de se melhorar, até mesmo esse mau pensamento se torna uma ocasião de progresso, porque ela o repele com energia. É o sinal duma mancha que ela se esforça para fazer desaparecer. Não cederá à tentação de satisfazer um mau desejo. Depois que haja resistido, sentir-se-á mais forte e feliz com a sua vitória.
Aquela que, ao contrário, não tomou boas resoluções, ainda procura ocasião de praticar o mau acto e, se não o praticar, não é por efeito da sua vontade, mas por falta de ocasião. É, pois, tão culpada como se o tivesse cometido.
Em resumo, aquele que não concebe a ideia do mal, já progrediu; aquele a quem essa ideia acode, mas que a repele, está próximo de alcançar progresso; aquele, finalmente, que pensa no mal e nesse pensamento se compraz, o mal ainda existe na plenitude da sua força. Num, o trabalho está feito; no outro, está por fazer-se. Deus, que é justo, leva em conta todas essas diferenças ao responsabilizar o homem pelos seus actos e pensamentos.

Texto de “O Evangelho Segundo o Espiritismo” e debatido na reunião da AELA, 3ª feira, em 16 de Março de 2010

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